A problemática do suicídio

A entrevista a seguir foi publicada no jornal Nosso Tempo, do Rio de Janeiro, em março de 2014. Nela é abordada a problemática do suicídio, dentro de seu contexto social e religioso. 

Nosso Tempo.  Em 20 anos, o número de mortes por suicídio no Brasil cresceu 1.900% na faixa etária de 15 a 24 anos. Podemos dizer que houve mudanças na forma como encaramos a morte hoje? Os altos índices de suicídio revelam uma realidade de banalização da vida?

Johnny Bernardo. Estamos diante de uma tragédia, de uma problemática social, de abrangência mundial, e não apenas nacional. A globalização, a universalização das mídias, tem parte de culpa no sentido em que coopera com a destruição de conceitos, de culturas e de tradições de um povo ou de uma comunidade local. Ao mesmo tempo, traduz para as nações subdesenvolvidas particularidades degenerativas de alguns países desenvolvidos, com graves problemas sociais, como os Estados Unidos. Portanto, é preciso compreender o fenômeno social chamado “suicídio” a partir de particularidades universais, mundiais, pois influenciam na forma como os adolescentes pensam, entendem a sociedade, se relacionam em grupos. É um fenômeno mundial!

Há uma fragilidade psicológica na adolescência que é agravada na medida em que fatores externos influenciam no modo de agir, de tomar decisões diante de “vergonhas”, de “exposições” em redes sociais. Em resumo, pode se dizer que a grande exposição em mídias sociais impulsiona as taxas de suicídio no Brasil. Há uma banalização, diria, dos direitos, do particular, do privado, via bullying e cyberbullying, como foi o caso da adolescente Amanda Todd. Também podemos apontar a ausência de distinção entre o real e o virtual como um agravante em alguns casos de suicídio. Neste sentido, o distanciamento da família, da conversa no parque, no relacionar-se com grupos sociais (como em igrejas), cria uma distorção que acaba por incorrer em tragédias, como as veiculadas pela mídia.

Não falar sobre o assunto ainda é a melhor saída, conforme preconiza a OMS, que pede restrições à imprensa ao divulgar dados e métodos empregados para suicídio?

Acredito no poder das campanhas, das conscientizações públicas. Quanto aos meios de comunicação há, de fato, um sensacionalismo, um explorar exacerbado de ocorrências como casos de suicídio ou mesmo terrorismo, que tem um efeito negativo na sociedade. Programas policiais, por exemplo, extrapolam ao focar demasiadamente em tragédias públicas. Podemos concluir que há uma necessidade de regulamentação do que é exposto nas mídias, na forma como estas se dirigem aos cidadãos, para que não se universalize fatos isolados. A mídia deve ter um papel social, que é o de instruir, de orientar, e não de explorar fragilidades sociais com objetivos financeiros.

Há algumas seitas que induzem seguidores à prática do suicídio coletivo. O que elas preconizam como um ato que vai de encontro ao que prega a maior parte das religiões?

O suicídio coletivo – a exemplo do que ocorreu na comunidade agrícola de Jonestown, na Guiana, quando 913 seguidores do Templo dos Povos tomaram cianureto – é parte da chamada “programação” que seitas destrutivas promovem sobre adeptos. São características comuns: recrutamento, isolamento social e psicológico, doutrinação, mortificação, destruição da personalidade, dependência ou subordinação ao líder ou “messias” e, em casos extremos, suicídio. Na verdade, o suicídio é usado mais como um último recurso quando uma seita destrutiva se vê ameaçada pelo Poder Público. Para não colocar os recursos adquiridos junto aos adeptos em risco, se desenvolve uma saída espiritual, que é o suicídio como uma forma de “escape do inimigo que os persegue”, ou como um meio de se “aproximar de Deus”, do “Paraíso, onde o fiel não mais sofrerá perseguições”. Também faz parte da programação encenações de suicídios e justificativas para um eventual “imolamento coletivo”. São características de seitas ou movimentos destrutivos, que não encontra respaldo em outras religiões ou grupos dissidentes mais tradicionais. Para o cristianismo, o suicídio é um pecado tal qual o homicídio, condenado pelas Escrituras Sagradas.