Um repúdio ao extremismo religioso

por Johnny Bernardo*

Acompanhamos com apreensão o desenrolar do sequestro de mais de 270 meninas de Chibok, no norte da Nigéria. Reivindicado pelo grupo islâmico Boko Haram, o sequestro comove pelo o fato de que a justificativa usada pelo movimento traz à tona questões humanitárias, dos direitos humanos, pois, ao ser contra a presença de mulheres em escolas – e o termo Boko Haram significa “a educação ocidental é um pecado” – dá uma clara demonstração dos males da intervenção religiosa na sociedade. Há alguns dias publicamos uma matéria na qual abordamos os perigos do extremismo religioso, da demasiada influência religiosa nas repartições públicas, na sociedade contemporânea.

A análise – intitulada “Que sociedade estamos construindo” – parte do princípio de que “a religião é um fator cultural, parte das sociedades primitivas, que inegavelmente tem contribuído com a construção de uma sociedade melhor, humanizadora, participativa”. Ao mesmo tempo, pontuamos “que seria impossível ao homem viver alheio a uma divindade, a uma crença, a uma tradição religiosa dada a sua necessidade de respostas, de apoio espiritual, de pertencimento”. Apesar de reconhecer a importância da religião enquanto fenômeno social, demonstramos que a existência de grupos extremistas no seio de instituições religiosas é um perigo pelo o fato de que os focos existentes podem evoluir para extremismos com potencial capacidade destrutiva.

No universo islâmico há, evidentemente, uma grande maioria de fieis que postulam por uma prática religiosa ecumênica, moderada, contextualizada no século XXI, nos avanços alcançados pelo Ocidente. No entanto, grupos fundamentalistas, militantes, caminham no sentido inverso ao recrutar soldados para suas fileiras, para seus campos de treinamento onde recrutas são treinados em táticas de guerrilha, induzidos a darem suas vidas em troca de um “paraíso de deleites sexuais”. Nesta guerra (“santa”) até mesmo crianças são recrutadas e submetidas a duros exercícios militares. Tal situação requer maior atenção de organizações reguladoras internacionais.

Há que se destacar que o extremismo religioso não é um fenômeno isolado, de uma única instituição religiosa, mas possui resquícios em praticamente todas as religiões e crenças existentes no mundo. Quando grupos religiosos não mais conseguem distinguir a Religião do Estado, o Sagrado do Secular cria-se uma situação de conflito, em que a entidade se vê no direito de intervir em órgãos públicos, criar mecanismos que permitam a ela impor posicionamentos. Também há de se reconhecer que grupos isolados no cristianismo também possuem visões distorcidas da militância religiosa. Neste sentido, inimigos tornam-se amigos quando estes possuem alvos em comum. Torturadores, incitadores ao ódio e ao linchamento público, são tomados como “exemplos de ética”. O extremismo é um mal que precisa ser rejeitado pela sociedade, estabelecendo no lugar uma sociedade acolhedora, de cidadãos que praticam suas crenças religiosas em consonância com os mais fracos, com os desprotegidos, com os divergentes. A sociedade precisa evoluir em cultura!



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*Johnny Bernardo é jornalista, pesquisador da religiosidade brasileira e das relações entre religião e sociedade, administrador do blog de entrevistas Somos Progressistas e do grupo Cristãos Progressistas.

Contato: pesquisasreligiosas@gmail.com